Ordenamento do Território dos Açores

Este item permite proceder à divulgação dos objetivos de qualidade de paisagem e das orientações para a gestão da paisagem dos Açores, com base nas paisagens identificadas, incluindo as respetivas caracterizações, elementos singulares e pontos panorâmicos, promovendo o conhecimento adquirido e o acompanhamento das políticas públicas de paisagem.

Caracterização e Identificação das Paisagens dos Açores | Graciosa

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Caracterização da Paisagem

De forma ovada, com 12,5 km de comprimento por 8,5 km de largura, a ilha Graciosa é a segunda ilha mais pequena do Arquipélago dos Açores, com cerca de 60 km2, a mais baixa, com grande parte da sua superfície a cotas inferiores aos 150 metros [altitude máxima no cume da Caldeira com 402 metros], e a de relevo menos acidentado, um pouco à semelhança de Santa Maria.  [+]

O próprio nome da ilha, “Graciosa”, sugere a exata representação visual que fazemos da sua paisagem, como bem expôs João de Melo: “Bem podiam os nautas ter-lhe posto o nome de “formosa”, que a ilha em nada se esquiva à noção de uma harmonia superior à própria ideia de beleza. Cuidaram eles, porém, de nela verem não um deslumbre ou um espanto do olhar, mas a gentileza da mulher e da ilha, toda a suavidade do feminino que nela se eleva acima da contemplação e da simples formosura – a sua “graciosidade” e, mais adiante, “...uma forma de presença que nunca esteve errada nem se perdeu da harmonia” [Melo, 2000]. 

Numa rápida visão, e grosso modo, poderemos considerar na ilha quatro zonas morfológicas distintas, que englobam uma ou mais das unidades de paisagem consideradas neste estudo: 

Planície agrícola de norte e noroeste, muito humanizada, dominando as culturas agrícolas, com destaque para a vinha, intercaladas por algumas pastagens, em grandes parcelas regulares; o povoamento linear dispersa-se ao longo das estradas e caminhos. Esta zona, com altitudes entre os 30 e os 100 metros, apresenta pontualmente pequenos aparelhos vulcânicos e representa cerca de 1/3 da superfície da ilha; Maciço Central, relativamente montanhoso, marcado pelas Serras Branca [360 metros], Dormida [398 metros] e das Fontes [375 metros], que dividem a ilha perpendicularmente às costas nordeste e sudoeste. Tem um relevo ora mais suave e arredondado, com pastagens, matos e alguma agricultura, ora mais acidentado, sobretudo com pastagens e matos, onde o povoamento é diminuto, embora no vale que separa a Serra das Fontes, a nordeste, das Serras Dormida e Branca, a sudoeste, seja evidente o povoamento linear contínuo, orientando no sentido paralelo ao vale; 

Vale entre o Maciço Central e o Maciço da Caldeira, estendendo-se desde a costa nordeste à costa oposta a sudoeste, subindo até quase aos 200 metros, mas muito abrigado dos ventos de oeste e noroeste e intensamente ocupado com usos muito diversificados – agricultura, fruticultura, pastagens, matos e maciços arbóreos; 

Maciço da Caldeira, no extremo sudeste da Graciosa, com uma altitude máxima de 402 metros, é a parte mais fresca e húmida da ilha, dominada por pastagens e uma ou outra mancha de arvoredo ou mato, exposta aos ventos. Porém, o interior da Caldeira, mais abrigado, apresenta-se com as vertentes bem revestidas de criptoméria [Cryptomeria japonica], ainda com algumas manchas de vegetação autóctone, e o fundo ocupado por pastagens permanentes. 

Sendo de origem vulcânica, na ilha Graciosa estão individualizadas três unidades geológicas, designadas como Complexo Vulcânico da Serra das Fontes, Complexo Vulcânico da Serra Branca e Complexo Vulcânico da Vitória / Vulcão Central [Gaspar, 1996], esta última a integrar tanto a plataforma a noroeste da ilha como o vulcão da Caldeira. As datações disponíveis indiciam uma idade máxima de 2,5 milhões de anos, o que faz com que se possa considerar a Graciosa como uma das ilhas mais antigas dos grupos central e ocidental deste Arquipélago, apenas superada em idade pela Terceira. Não foram registadas erupções nos tempos históricos, pois as formações mais recentes, associadas ao Pico do Timão, deverão ter pouco menos de 2 mil anos. 

O Vulcão Central da Graciosa apresenta uma forma alongada, segundo uma direção noroeste/sudeste, tendo uma caldeira, de forma oval, com cerca de 350 metros de profundidade. No interior desta caldeira existem alguns cones de pequena dimensão e, na sua extremidade sudeste, localiza-se a Furna do Enxofre, uma imponente caverna de origem vulcânica, que possui no seu interior um lago subterrâneo e um campo fumarólico. Com um comprimento máximo de 194 metros, cerca de 80 metros de altura máxima e com um teto em abóbada perfeita, esta cavidade vulcânica é reconhecida nacional e internacionalmente pela singularidade da sua génese, dimensões e características. 

A costa da ilha é rochosa, geralmente baixa [até 20 a 30 metros de altura], mas ultrapassando os 250 metros nas arribas da Serra Branca, na costa sudoeste, e os 170 metros na Ponta da Restinga, a sudeste. Como exceção, há um pequeno troço de costa muito baixa e arenosa na zona da Praia, a nordeste. O acentuado recorte costeiro dá lugar à formação de interessantes baías – Porto Afonso, Caldeirinha, Filipe, Folga, Quarteiro, Poça, Engrade e Lagoa – alternando com formações rochosas de intensa cor negra ou mais avermelhada nas pontas mais altas, nomeadamente na da Restinga, na zona de Ponta da Barca e no curioso Ilhéu da Baleia. Na Ponta Branca os depósitos de origem essencialmente traquítica são, como o próprio nome indica, mais claros. A curta distância da costa encontram-se dois ilhéus, que atualmente estão classificados como Zonas de Proteção Especial para a Avifauna: o Ilhéu da Praia, com cerca de 12 hectares e 51 metros de altura máxima, revestido de vegetação, e o Ilhéu de Baixo, cone de escórias erodido, fronteiro à Ponta da Restinga/ Carapacho, com cerca de 9 hectares e 73 metros de altura. É nestes ilhéus, assim como nas zonas costeiras limítrofes, que nidifica uma das duas espécies de aves endémicas dos Açores, o painho-de-Monteiro [Oceanodroma monteiroi]. Também as Pontas da Restinga, da Barca e Branca estão classificadas como áreas protegidas pelos importantes valores presentes, quer em termos de habitats costeiros, de espécies faunísticas, nomeadamente de aves marinhas, quer pelos valores estéticos e culturais presentes, como é o caso dos faróis que pontuam a paisagem nas Pontas da Restinga e da Barca. 

A baixa altitude que caracteriza a Graciosa justifica ser esta uma das ilhas menos húmidas de todo o Arquipélago, se não a mais seca, não ocorrendo ali a chuva orográfica, ou seja, a precipitação devida ao efeito de altitude, vulgar nas restantes ilhas [Pena e Cabral, 1996]. 

 

Sendo atualmente uma das ilhas mais intervencionadas pelo Homem, e com um carácter vincadamente rural, a vegetação natural dos matos primitivos quase desapareceu, consequência da apetência agrícola da ilha, da necessidade de lenhas e da facilidade de acessos aos seus pontos mais altos. Apesar de aqui praticamente não ocorrerem as principais espécies da Laurissilva de maior altitude, existe um património vegetal com alguma importância associado às zonas costeiras, estando referenciada a presença de vidália [Azorina vidalii], considerada a espécie mais ameaçada do Arquipélago [Martín et al., 2008]. Apresenta, ainda, uma riqueza significativa de flora terrestre endémica, contando com 60 espécies endémicas, das quais 40 são endemismos dos Açores e 20 endemismos da Região Macaronésica [SRAM, 2012].  [+]

Porém à data da descoberta, Gaspar Frutuoso [1963] dá-nos conta do manto de arvoredo que cobria toda a terra de tal forma que, à chegada à ilha em meados do século XV, o capitão Vasco Gil do Sodré, teve grandes dificuldades em penetrar no interior e “desembarcando em um grande areal e não sabendo pera onde fosse com a mulher e filhos, por a terra estar toda coberta de espesso arvoredo, achou um carreiro que o gado tinha feito, e, caminhando por ele pela terra dentro, foi ter a uma furna, que se chama a Furna do Castelo, feita como uma casa de pedra, ao modo de abóbada muito fermosa, onde se meteu e agasalhou com sua gente”. 

Com uma agricultura cerealífera praticada desde os primeiros tempos do povoamento, e aglomerados habitacionais distribuídos por toda a ilha e não apenas no litoral, a carência de lenhas e madeira foi sentida na Graciosa, pelo menos, desde o século XVIII, suprida com as importações das outras ilhas [Faial e, sobretudo, Pico] ou, em alternativa, pela queima de vides, palha ou bosta do gado bovino. Atualmente, os valores que constam do Recenseamento Agrícola de 2009 [SREA, 2009] apontam para uma redução da Superfície Agrícola Útil [SAU] entre 1999 e 2009 na ordem dos 6%, causada pela descida drástica, para menos de metade, das áreas ocupadas com culturas permanentes e a manutenção em números residuais das matas e florestas incluídas nas explorações agrícolas. As quebras foram, por outro lado, compensadas com a expansão das pastagens verificada no mesmo período, passando estas a representar 84,8% da SAU da ilha, ainda assim um valor situado abaixo da média dos Açores. 

O povoamento ocorreu no terceiro quartel do século XV, com o estabelecimento do capitão Pedro Correia da Cunha, o seu primeiro Capitão Donatário. A fixação da população no território segue um padrão algo diferente do verificado nas restantes ilhas com uma distribuição de tipo linear mas ocupando também o interior, ou, como alguém afirmou, “em dispersão orientada”, quase como em Santa Maria, pelo facto de apresentar um interior com povoações quase contínuas e a costa, à exceção de Santa Cruz e Praia, praticamente desabitada. Os povoados rurais do tipo linear, ou semi-linear, como na Ribeirinha, mais dispersos ou mais continuados, de limites imprecisos, desenvolvem-se ao longo de uma rede de caminhos que contornam os acidentes topográficos e nunca sobem acima dos 200 metros, evitando assim os inconvenientes climáticos de maiores altitudes. Mesmo na Praia, vila entre 1546 e 1867, “o povoamento organiza-se a partir da via marginal, que constitui o eixo de uma incipiente estrutura urbana linear” [Tostões et al., 2000]. Só Santa Cruz, vila desde cerca de 1480 e atualmente única sede de concelho, apresenta um traçado urbano concentrado. 

A Graciosa perdeu na última década 8,1% da sua população, passando de 4780 habitantes, em 2001, para 4393 em 2011, de acordo com os dados do Instituto Nacional de Estatística [INE]. Em 2001, a densidade populacional da ilha era de 70,8 hab/km2. 

Na sua paisagem rural são notáveis as extensas áreas de currais cultivados de vinha, sobretudo a noroeste de Santa Cruz, pela regularidade das reduzidíssimas parcelas delimitadas por muretes de pedra solta, negra, sobre biscoito. Estes terrenos de lava, por serem quase improdutivos ou impossíveis de outro aproveitamento, foram preparados para a cultura da vinha a partir do século XVI. Com a diminuição da produção ou a morte das vinhas devido ao ataque do oídio [iniciado em meados do século XIX] e da filoxera [surgida nos finais do mesmo século], as vinhas foram invadidas por matos, expecto em locais mais secos onde as referidas doenças e pragas não vingaram e, portanto, não afetaram a vinha. Nalguns povoados, as courelas retangulares de cultivo desenvolvem-se desde as casas e estrada, perpendicularmente a esta, até aos matos na parte superior da encosta.

Complementarmente à paisagem rural dominante, é digna de nota a paisagem urbana e o património arquitetónico de Santa Cruz, bem como os pitorescos moinhos de vento do século XIX e da primeira metade do século XX, que ainda sobrevivem no alto de uma ou outra colina, frequentemente já transformados em habitação de lazer. Para suprir uma parte das necessidades energéticas da ilha, foi instalado há alguns anos, na Serra Branca, um parque eólico com alguns geradores de grande dimensão e que constituem como que os equivalentes modernos aos antigos moinhos de vento, numa escala ampliada e que, por isso mesmo e desde que criteriosamente localizados, podem acrescentar valor plástico e movimento à paisagem. Para além dos moinhos, diversas outras estruturas da arquitetura de produção tradicional atestam as seculares capacidades de produção agrícola da ilha, nomeadamente a presença de palheiros, de sequeiros de milho – as toldas ou burras – e de um impressivo conjunto de tanques, cisternas e outros elementos construídos vernáculos que integram a “arquitetura da água” da Graciosa, de reconhecido valor patrimonial. Também na linha de costa, associada à facilidade de acesso ao mar e às potencialidades piscatórias da ilha, existe um conjunto de estruturas tradicionais de interesse patrimonial ligadas à pesca, de que são exemplo as casas de aprestos escavadas nas arribas de cor vermelha de Porto Afonso. 

Nesta ilha de relevo geralmente pouco acidentado, como já referido, a erosão dos solos está principalmente localizada nas zonas superiores e mais declivosas da Caldeira, Serra das Fontes, Serra Dormida e Serra Branca, existindo aqui algumas grotas mais escavadas, atualmente revestidas de vegetação, que ocasionalmente drenam para o mar o excesso da água das chuvas das terras a montante. Mas a baixa precipitação e a quase inexistência de nascentes – exceção feita para as águas térmicas medicinais de Carapacho – obrigaram a outras formas de captação de água potável destinada ao abastecimento público: em duas áreas menos elevadas no interior da ilha procedeu-se à abertura de furos; também as cisternas e tanques espalhados pela ilha são sinais evidentes dessa escassez de água. Parece, por isso, oportuno começar a estudar um sistema de recarga dos aquíferos por meio da implementação, em zonas propícias, de vegetação arbustiva adequada à retenção da água, como é o caso da urze [Erica azorica], e de pequenas bacias de retenção, para um melhor aproveitamento da pouca água doce de origem pluviométrica disponível. 

É notória a tendência para a construção de casas de férias e outras estruturas na orla costeira, com todos os inconvenientes ecológicos e paisagísticos que daí advêm, pelo que será do maior interesse, e ainda relativamente fácil, atuar em conformidade com a legislação específica e os planos aprovados, de modo a conservarem-se os valores ali existentes, atestados pela classificação da ilha em 2007 como Reserva da Biosfera [UNESCO]. 

Algumas das principais potencialidades atuais da Graciosa têm uma relação muito direta com a paisagem, nomeadamente as atividades turísticas e recreativas [passeios a pé, de bicicleta ou a cavalo; visitas à Furna do Enxofre, a locais altos de grandes panorâmicas ou às arribas mais interessantes; mergulho; passeios de barco; observação de cetáceos e desportos náuticos], a recuperação de património construído, das vinhas e dos currais [com a indispensável qualificação do vinho e da sua comercialização], assim como a fruticultura, numa perspetiva de complementaridade. Refira-se também o potencial das termas do Carapacho, cuja estância termal foi recentemente recuperada.

Incidência de Instrumentos de Gestão Territorial

Incidência de Regimes e Instrumentos de Conservação da Natureza

  G1G2G3G4G5G6G7
Parque Natural da Ilha Graciosa [PNI Graciosa]GRA01      
GRA02    
  
GRA03     
 
GRA04      
GRA05 
 
  
GRA06
      
GRA07      
GRA08
     
Rede Natura 2000 [RN2000]PTGRA0015      
PTGRA0016  
    
PTZPE0029      
PTZPE0030    
  
GeossítiosGRA 1    
 
GRA 2 
    
GRA 3
      
GRA 4 
     
GRA 5      
GRA 6  
 
  
GRA 7
     
GRA 8  
  
GRA 9 
     
Sítio Ramsar1798     
 
Reserva da BiosferaZona Núcleo
 
 
Zona Tampão
 
Zona Transição
Biótopos CorineC233    
  
C234      
Perímetro FlorestalNF Caldeira da Graciosa     
NF Serra Branca  
   
RFR Caldeira da Graciosa     
 
VF Caldeira da Graciosa     
 
Perímetro de Ordenamento AgrárioSanta Cruz/ Guadalupe