Este item permite proceder à divulgação dos objetivos de qualidade de paisagem e das orientações para a gestão da paisagem dos Açores, com base nas paisagens identificadas, incluindo as respetivas caracterizações, elementos singulares e pontos panorâmicos, promovendo o conhecimento adquirido e o acompanhamento das políticas públicas de paisagem.
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Caracterização da Paisagem
- A ilha das Flores vista a partir do Corvo – RO
- Lagoa Comprida – SIARAM
- Particularide da encosta - RO
- Lagoa Negra - SIARAM
- Rocha dos Bordões – SIARAM
- Lagoa Funda – SIARAM
- Fajã Grande -SIARAM
- Lagoa Rasa – SIARAM
- Cascata – SIARAM
- Pormenor de uma encosta da Lagoa Comprida com vegetação endémica – SIARAM
- Poço da Alagoínha ou Lagoa dos Patos – SIARAM
A ilha das Flores, possivelmente descoberta por Diogo de Teive cerca do ano de 1452, foi povoada muito mais tarde que as ilhas dos grupos central e oriental, já no início do século XVI. Com uma forma arredondada, alongada no sentido norte-sul, é a sexta ilha do Arquipélago em superfície, com 141 km2 [cerca de 17 por 12,5 km] e altitude máxima de 915 metros no Morro Alto, na parte central da ilha. [+]
João de Melo [2000] dá-nos a seguinte visão das Flores: “O cenário não pode ser mais grandioso. Nenhuma outra forma de perfeição deve exigir-se a esta força da natureza duplamente intemporal: primitiva no ser e fora no tempo em que ela hoje existe. Ou seja, a sua [ir]realidade”. Mais à frente acrescenta “Nenhuma teve a fortuna de realizar uma tão perfeita noção de ilha como as Flores. Dela se pode e deve dizer que é, sem dúvida, a ilha de todas as ilhas portuguesas”.
De origem vulcânica, assenta, como o Corvo, na placa norte-americana. A sua idade rondará os 2,16 milhões de anos, portanto mais antiga que a maioria das restantes ilhas, à exceção de Santa Maria, São Miguel, Terceira e Graciosa. A percentagem de basaltos é menor nesta ilha, enquanto a ocorrência de hawaítos é aqui significativa, como em partes de São Miguel. A faixa costeira, muito recortada e erosionada pelo mar, é constituída por basaltos e traquitos, frequentemente com altas arribas, na base de algumas das quais se formaram fajãs detríticas.
A conhecida e emblemática Rocha dos Bordões, com a sua enorme estrutura basáltica prismática, apresenta um padrão raro, qual “fortaleza esculpida e miudamente trabalhada acima da vertente pedregosa. O verde da erva serve de telhado a esta basílica de lava vulcânica” [Melo, 2000].
O clima das Flores é temperado húmido e chuvoso em todas as estações, do tipo Cf [classificação de Köppen], de características oceânicas mais vincadas que nos restantes grupos de ilhas. Os valores correspondentes ao período de 1979/1990, indicam uma precipitação média anual no aeroporto das Flores, a 34 metros de altitude, de 1716 mm, bastante mais que em Angra do Heroísmo, Horta ou Ponta Delgada. No referido período, a temperatura média anual foi de 17,0 ºC e a humidade relativa do ar rondou os 81%, não muito diferente das outras ilhas açorianas. Os ventos, predominantes do quadrante de oeste [NW, W, SW], atingem com frequência os 100km/h.
Com um relevo muito vigoroso, esta ilha é fruto da atividade combinada de diversos grandes vulcões com caldeiras, atualmente bastante desmanteladas, posteriormente sobreposta com a de alguns cones menores. Daqui resultou uma estrutura planáltica em dois degraus, que se prolonga até à orla costeira. No patamar norte, desenvolvido a uma altitude média de 600-700 metros, onde a vastidão, o silêncio, a tranquilidade e a homogeneidade dos tons de verde tomam conta da paisagem, encontra-se o Morro Alto, o Pico da Burrinha e, ainda, o da Testa da Igreja e o Pico da Sé. No patamar inferior, a sul, com altitudes entre os 500 e os 600 metros, os aparelhos vulcânicos são mais pequenos e mais modernos. Nas zonas aplanadas envolventes destes cones, encontra-se um grupo de crateras de explosão associadas a erupções hidromagmáticas [maars] formando por vezes lagoas [sete ao todo], de que são exemplos as Lagoas Funda, Comprida e Rasa.
Todo o litoral das Flores, com destaque para as arribas, exibe um vigoroso recorte, complementado pelos inúmeros ilhéus e penedos ao longo da costa. O conjunto da Fajãzinha, Cuada e Fajã Grande, até Ponta da Fajã, bem como a imponente arriba fóssil que a delimita do lado oriental, com a sua vegetação essencialmente natural e as grandes quedas de água [nomeadamente a da Ribeira Grande, que se despenha num salto de cerca de 300 metros], compõe um dos trechos mais impressionantes do contrastante litoral florentino. O mesmo se pode dizer da ampla paisagem vista da Ponta do Albarnaz na direção do Morro Alto, englobando a costa ocidental da ilha e seus ilhéus, incluindo o de Maria Vaz [classificado como Reserva Natural] e o de Monchique [ponto mais ocidental dos Açores e da Europa], com a sucessão de pastagens e de matos até ao cimo da encosta visível e a extraordinária transparência da água do mar junto à costa. A profusão de pontas, baías, grutas e cascatas forma um conjunto de impressionante beleza e diversidade biótica, que conduz a que as costas nordeste, sul e sudoeste tenham o estatuto de áreas protegidas.
Com substanciais recursos hídricos, esta ilha possui numerosas ribeiras de caudal permanente e linhas de água secundárias, na sua maioria profundamente encaixadas até à rocha, as quais desaguam sobretudo na costa leste [e também na costa poente]. Alguma água é retida no planalto, nas várias lagoas ali existentes, enquanto outra parte é infiltrada e retida nos aquíferos subterrâneos, a profundidades variáveis. Por vezes a zona de saturação atinge a superfície do solo, dando origem a zonas de turfeiras, como acontece junto das lagoas do planalto inferior, onde surge uma vegetação dominada pelos géneros Sphagnum e Juncus em terreno impermeabilizado por óxidos de ferro.
A flora da ilha inclui algumas áreas extensas de Laurissilva Macaronésica, húmida e híper-húmida, correspondente a relíquias parciais da vegetação que ocupava o sul da Europa e Norte de África antes da última glaciação. As Flores possuem 55 taxa vasculares endémicos [quarto lugar em conjunto com São Jorge na escala das nove ilhas] e 550 taxa de plantas indígenas, sendo uma das ilhas com menor diversidade florística de plantas vasculares. Contudo, é imprescindível referir os núcleos de Laurissilva ainda existentes nas zonas superiores da ilha, nomeadamente o relevante povoamento da endémica açórica cedro-do-mato ou zimbro [Juniperus brevifolia] que surge por vezes conjugado com turfeiras, o que só por si constitui um valioso património natural.
A presença de diversas tipologias de zonas húmidas, particularmente de turfeiras, é uma das características individualizadoras da vegetação natural desta ilha, que poderá encontrar-se ameaçada pela alteração de usos do solo, nomeadamente pela expansão de pastagens ou pelo desenvolvimento da vegetação exótica [nomeadamente das hortênsias, com um comportamento invasor nas Flores]. Deve salientar-se que as turfeiras são uma formação característica dos Açores – e única no contexto da Macaronésia – com a particularidade de ocuparem a posição mais a sul na bacia do oceano Atlântico. São também habitats prioritários para a conservação da natureza no âmbito da Rede Natura 2000.
- Pormenor da flora autóctone existente no planalto central - SIARAM
- Uma das muitas cascatas presentes na ilha - SIARAM
- Fajãzinha - SIARAM
- Lugar da Ponta da Fajã na Fajã Grande – SIARAM
- Atividade agrícola na Fajã Grande - SIARAM
- Zona de Lagoa - RC
O povoamento das Flores não se desenvolveu de forma tipicamente linear e periférica, como aconteceu na maioria das restantes ilhas do Arquipélago. Aqui, a fixação humana procurou essencialmente as depressões mais largas e acessíveis ou as plataformas abertas e baixas junto ao mar, não sendo por isso comandado pela rede viária e assumindo alguma dispersão, muito embora aglomerando-se em pequenos núcleos. “Há assim um modelo de povoado, geral à ilha, que fica a meio caminho entre a concentração e a dispersão, entre a ordem e a amálgama.” [Tostões et al., 2000]. Embora Lajes, na ponta sudeste, tenha sido a primeira a receber o estatuto de vila, em data incerta mas ainda no século XVI, foi Santa Cruz que se afirmou como principal aglomerado urbano. Até há poucos anos as duas vilas da ilha não tinham comunicação por estrada, mas apenas por atalhos ou por mar, o mesmo sucedendo entre vários outros povoados mais pequenos. [+]
No Recenseamento de 2011 [SREA, 2011], o concelho de Santa Cruz das Flores registava 2288 indivíduos residentes e o de Lajes 1503, acusando o primeiro uma ligeira diminuição relativamente aos valores de 1991. Segundo os dados mais recentes, a ilha das Flores regista uma densidade populacional de 26,5 hab/km2.
A principal ocupação da população está relacionada com as atividades agrícolas ou pecuárias. “Todas as aldeias do litoral, viradas para o mar, têm uma dúzia de campos de milho e de batata-doce e cultivam alguns olheiros de inhames necessários para a sua alimentação. O resto é pasto. À volta e sempre, relvas, ondulações verdes de colinas” [Brandão, 1926]. As condicionantes do solo, marcadas pelos declives acentuados e riscos de erosão, e por vezes pela drenagem deficiente em zonas de altitude, reduzem as áreas consideradas com boa capacidade agrícola para apenas cerca de 10% dos solos da ilha. Trata-se de uma percentagem baixa, próxima da verificada no Corvo e em São Jorge, que condicionou a história agrícola das Flores, tanto como o processo de fixação e ocupação do território. O acesso ao mar, igualmente difícil pelas características orográficas da ilha, não deixou de permitir uma tradicional atividade pesqueira, de caça à baleia ou outras relacionadas com o oceano, hoje mais facilitada pelos dois portos principais de Lajes e Santa Cruz, além de outros secundários.
Em contraciclo com o que aconteceu na maioria das ilhas açorianas, as Flores registaram nos últimos anos uma expansão do setor pecuário, expresso não só no aumento da área de pastagem permanente [7,3%], como no de efetivos bovinos, sendo das únicas ilhas em que tal se verificou, a seguir a São Jorge. Apesar da redução do número total de explorações agrícolas, com uma quebra na ordem dos 29% durante a década 1999-2009, a área total de exploração cresceu cerca 5,4% e a Superfície Agrícola Útil [SAU] da ilha das Flores e sofreu um acréscimo de 5,7%. Pelo contrário, as explorações agrícolas de tipo familiar caem drasticamente, descendo para metade as áreas reservadas a culturas permanentes.
As formas de humanização da paisagem que de certa forma “adoçaram o excesso de natureza”, encontram-se presentes nos diversos aspetos socioculturais. A arquitetura tradicional, muito próxima dos modelos usados na ilha do Faial e com alguns aspetos morfológicos comuns à Graciosa, adota preferencialmente uma estrutura linear, sendo frequente a casa com cozinha dissociada. Marcadamente rural, a casa linear florentina assume uma posição livre relativamente à rua, por vezes na perpendicular a esta e está normalmente acompanhada das construções de apoio, balcões e pequenos quintais. Nas Flores, não existem as praças ou os centros cívicos dos meios mais urbanos que concentram os edifícios de prestígio. No entanto, cada povoado possui um pequeno largo onde, invariavelmente, se situa o característico império-casa das Flores e Corvo, discretamente alinhado com as restantes fachadas do arruamento – a distinção é assinalada pela presença simbólica da coroa do Espírito Santo em relevo – funcionando como local de reunião, de festa e convívio que aqui substitui o largo da igreja. Uma outra presença assinalável na paisagem florentina é a profusão de moinhos de água, de um ou dois rodízios [nas Flores não existem moinhos de vento], de um modo geral semelhantes aos que se vêm noutras ilhas açorianas.
As potencialidades turísticas são aqui evidentes e têm sido gradualmente exploradas, sobretudo dirigidas aos apreciadores da natureza, através de atividades ligadas à observação e estudo da flora e fauna, da geologia e vulcanismo, das paisagens diversificadas, bem como explorando as possibilidades dos passeios a pé, da pesca e do mergulho.
Há que zelar pela conservação do património natural e, consequentemente, ter o maior cuidado com a introdução de espécies exóticas e evitar a destruição de matos espontâneos em favor de novas áreas de pastagens ou florestais. A qualidade da água das suas lagoas deverá ser outra preocupação permanente, através de ações de proteção, melhoria e monitorização, uma vez que se trata de um meio muito suscetível à poluição e que dele dependem ecossistemas significativos e, também, algumas atividades humanas. A disseminação de novas construções, muito visível sobretudo nas vilas de Lajes e Santa Cruz – aqui potenciada pela presença do aeródromo implantado junto do núcleo urbano – e os consequentes problemas da qualidade arquitetónica e integração paisagística, devem ser acautelados no âmbito de uma política coerente de ordenamento territorial, em que se incluirá a preservação da sua identidade. A importância do seu património natural conduziu a que esta ilha fosse incluída em 2009 na Rede Mundial de Reservas da Biosfera [UNESCO].
Incidência de Regimes e Instrumentos de Conservação da Natureza
FL1 | FL2 | FL3 | FL4 | FL5 | FL6 | FL7 | ||
Parque Natural da Ilha das Flores [PNI Flores] | FLO01 | FLO02 | FLO03 | FLO04 | FLO05 | FLO06 | FLO07 | FLO08 | FLO09 |
Rede Natura 2000 [RN2000] | PTFLO0002 | PTFLO0003 | PTZPE0021 | PTZPE0022 | ||||
Geossítios | FLO 1 | FLO 2 | FLO 3 | FLO 4 | FLO 5 | FLO 6 | FLO 7 | FLO 8 | FLO 9 | FLO 10 | FLO 11 | FLO 12 | FLO 13 |
Sítio Ramsar | 1806 | |||||||
Reserva da Biosfera | Núcleo | Tampão | Transição | |||||
Biótopos Corine | C204 | C216 | C217 | C218 | ||||
Perímetro Florestal | NPB Caldeira Seca | NPB Cantos | NPB Escrivoas | NPB Feitos da Caveira | NPB Juncal | NPB Pico do Touro | NPB Ponta Ruiva | NPB Rochão dos Carneiros | RFR Luís Paulo Camacho | RFR Fazenda Santa Cruz | RFR Boca da Baleia |